Entrevista com Pedro Vieira Abramovay Assessor jurídico da liderança do governo no senado – 2003, assessor especial do ministro da justiça – 2004-2006, secretario de assuntos legislativos do ministério da justiça – 2007-2009, secretário nacional de justiça – 2010, professor da FGV-RJ
– Considerando esse evento onde mais uma revista esta sendo publicada sobre o combate às drogas, de que forma você acredita que esse debate, ao se tornar mais acessível à sociedade, possa influenciar na construção de políticas públicas de segurança mais eficazes?
– Eu acredito que justamente um dos problemas das políticas serem tão ineficazes é a falta de debate e grande parte da estratégia política foi proibi-lo. Então, fazer o debate de várias formas é fundamental. Hoje, no entanto, vemos que debate público que antes era monopolizado por instituições públicas, está sendo mediado mais por partidos, sindicatos, manifestações públicas e novas redes sociais. Agora, pela primeira vez, já se tem até uma revista que aborda só sobre esse assunto. Dessa forma, acho muito difícil que se sustente a política da maneira como ela é se a gente conseguir estender esse debate.
– Como você avalia a tentativa progressista do governo de fazer uma nova lei sobre as drogas, mas que acabou tento efeitos colaterais de endurecimento da pena, reafirmação do abismo entre as classes sociais frente a justiça, super encarceramento de um tipo penal e mudança do perfil da população carcerária?
– Fez-se uma nova lei com base em uma ideia progressista e ela acabou tendo o efeito inverso, ocorrendo assim um encarceramento em massa. Creio que isso tenha várias explicações: Primeira, não é uma explicação, e sim um alerta às reformas parciais, pois reformas parciais e não reformas profundas podem gerar efeitos controversos como os que aconteceram aqui. Segunda é que a lei é muito aberta, o que deixa a decisão nas mãos do juiz. E nesse tema, a decisão acaba seguindo a lógica da guerra. Nós precisamos de leis com critérios mais fechados do que vemos nesta atual, para segurar essa fúria punitivista que a guerra às drogas coloca nas agencia punitivas. As leis de Portugal, República Tcheca, em alguns casos australianos, seguiram o caminho da quantidade e acredito que esse é um caminho possível para nós. Se a pessoa tiver portando menos que determinada quantidade, ela não pode ser presa por trafico. Porém, ainda assim, é uma solução parcial, possibilitando riscos.
– E considerando a realidade atual dentro das instituições públicas, qual a chance de se rever o que foi feito e reverter esse quadro tendo em vista que os discursos e as práticas sempre vão em direção a administrar o problema e não de fato solucioná-lo?
– Há vários caminhos. Hoje no Congresso não tem nenhuma chance. No entanto há outros dois grandes caminhos. Primeiro vem sendo traçado pelo Supremo Tribunal Federal, que tem um papel importante de afirmar a constituição e dizer que não importa que estejamos em guerra nesse tema, a constituição ainda é mais importante. Algumas decisões nesse sentido já foram dadas pelo Supremo, em relação à proibição de liberdade provisória, à possibilidade de substituição por pena alternativa, à farmácia da maconha… Agora, a próxima decisão que pode ser que o STF tome é que é inconstitucional criminalizar o porte para consumo. Se isso acontecer pode ser um passo novo no debate e então precisaremos repensar como se faz de fato uma lei que não criminaliza, qual a alternativa para o consumo, como se lida com a questão medicinal… Creio que isso possa reinaugurar o debate colocando um parâmetro para impedir retrocessos e faz-nos pensar em novas questões. Já para reformas mais profunda, não há outra maneira, somente com mobilização popular. Acredito que os EUA esta bem perto disso hoje, pois mais da metade da população, por causa das pressões, pressão por plebiscito, de um debate publico muito grande acaba sendo menos conservadora que a nossa nesse tema. Portanto creio que o caminho é fazer debates e ir para as ruas.
Por Leda Vasconcellos e João F. Finazzi
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