Por Mariana Castilho e Hasan Boscariol - graduandos em Relações Internacionais pela PUC-SP e membros do Programa de Educação Tutorial (PET-RI)
A Cúpula de Líderes sobre o Clima aconteceu nos dias 22 e 23 de Abril, onde mais de 40 representantes, entre eles chefes de Estados, se reuniram virtualmente a convite e organização de Joe Biden para discutir as mudanças climáticas globais. O encontro marcou a volta dos Estados Unidos da América aos debates internacionais sobre o clima e forneceu ao Brasil uma oportunidade de melhorar sua imagem internacional frente às questões do clima e meio ambiente, principalmente sobre o desmatamento na Amazônia.
O governo de Jair Bolsonaro adentrou a Cúpula acumulando uma extensa trajetória de desavenças com seus pares internacionais. Tendo sido eleito com discursos contrários à priorização da pauta ambiental, Bolsonaro e seu atual ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, têm colocado publicamente opiniões infundadas sobre o avanço contínuo do desmatamento nos biomas nacionais, além de ter movimentado cortes e um verdadeiro desmonte da fiscalização ambiental nacional, e, por consequência, é alvo constante de acusações de entidades internacionais e governos.
Um exemplo prático da atual incapacidade do governo brasileiro no cenário internacional se deu em 2019 com o congelamento do Fundo Amazônia. O Fundo Amazônia é um projeto de angariação de fundos internacionais para prevenir, monitorar e combater o desmatamento na Amazônia, e tinha como seus principais patrocinadores os governos da Noruega e Alemanha, ambos que se recusaram a manter o financiamento com as resoluções de Brasília.
Fonte: Katie Maehler / Mídia NINJA
Recentemente, o discurso anti-ambiental do governo federal tem se contido em face a eleição de Joe Biden nos EUA e sua política combativa no campo climático em relação a seu antecessor. A equipe de Biden, encabeçada pelo ex-Secretário de Estado John Kerry, tem se demonstrado mais solicita em ingressar novamente Brasília no regime climático internacional, como demonstrado pelo próprio convite para a Cúpula e pela reunião entre Kerry, Salles e Ernesto Araújo, ex-Chanceler brasileiro, em fevereiro deste ano.
Partindo dessa recente alteração de posicionamento público, o discurso de Bolsonaro no primeiro dia da Cúpula tratou, entre outros apontamentos, sobre o pioneirismo nacional no regime climático, em especial sobre matrizes energéticas, e sobre a nova proposta do governo federal em acabar com todo desmatamento em território brasileiro até 2030, mas ressaltando o desejo de vinculação econômica internacional compensatória pelos atos brasileiros.
Fonte: Marcos Correa/Brazilian Presidency via Reuters
Contudo, o discurso não obteve apoio doméstico e internacional. Algo já corriqueiro nos discursos federais, Bolsonaro apresentou dados falsos e eufemistas sobre as ações do Estado brasileiro, além de não ter apresentado nenhuma medida palpável de real alteração de políticas que não somente discursiva. Tendo, inclusive, autorizado nos dias seguintes a seu discurso um corte de 35,4% da pasta do Meio Ambiente.
Em suma, a participação de Bolsonaro na Cúpula do Clima de 2021 não auxiliou na alteração da imagem nacional no âmbito do regime climático. Contudo, atores para-diplomáticos têm se mobilizado para avançar, mesmo que sem o apoio federal, nas discussões em pró de uma “economia verde”.
Os governadores de todos os 26 estados mais o Distrito Federal se uniram em uma aliança para promover o desenvolvimento da agenda sustentável brasileiro, com participantes de diversos vieses políticos, em conjunto com o governo estadunidense e assim, enviaram uma carta proposta para o presidente dos Estados Unidos. Os “Governadores pelo Clima” começam a carta parabenizando o presidente Biden e a vice-presidente Harris pela vitória nas eleições, já apresentando divergências da postura adotada pelo chefe de Estado Jair Bolsonaro, em seguida os governadores demonstram interesse no desenvolvimento de parcerias a favor da preservação do meio ambiente.
Em trecho da carta os remetentes afirmam que “Visando avançar com visão sistêmica, velocidade e em larga escala, a aliança Governadores Pelo Clima, está estruturando políticas climáticas, sociais e econômicas interligadas e vem construindo intercâmbios com governadores dos Estados Unidos, lideranças da América Latina e governos da Europa e do Reino Unido, sede COP26, onde desejamos apresentar inovações e parcerias de alto impacto.” Assim, eles se apresentam como atores do governo subnacional capazes de agir e negociar com Estados sem os veículos tradicionais das negociações de política externa.
Com isso, ressaltamos uma nova construção na política ambiental brasileira que possivelmente passará do âmbito federal para o dos membros da União. Essa desestruturação não é algo novo na política nacional, contudo se mostra como mais um aspecto da fragilidade da atual gestão de Jair Bolsonaro, que alavanca desavenças e quebra parcerias tanto em nível internacional quanto nacional.
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