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Hamas e Direita Israelense: da Rivalidade ao Reforço de Popularidade?

Recentemente, nos meses de julho e agosto, viu-se uma escalada de violência entre os habitantes de Israel e da Faixa de Gaza, processo que culminou na morte de mais de 2100 habitantes de Gaza (dos quais quase 500 são crianças), e no falecimento de 69 israelenses, dos quais 65 pertenciam às forças armadas. Para além do desproporcional número de mortes devido à intensidade do ataque israelense, vale ainda destacar que 28% da população que vivia em Gaza foi desabrigada durante esses meses, totalizando cerca de 500 mil pessoas [1]. Nesta guerra entre israelenses e palestinos, deve-se direcionar a atenção à existência de outra batalha no interior de ambas as nações: entre aqueles que veem a violência como necessária e útil para seus interesses e outros que a enxergam como contrária às vontades das pessoas que moram na região.

Posto isso, deve-se investigar se as atitudes violentas do Hamas ajudam a sua população em sua luta por direitos humanos básicos ou não, ao passo que se deve indagar se os israelenses belicosos realmente agem no sentido de proteger os habitantes de Israel. A partir da análise das consequências da escalada de violência nas duas sociedades feita por meio de pesquisas e reportagens, percebe-se que, na prática, Hamas e direita israelense parecem, cada um, colaborar com o crescimento de popularidade do outro.

Ao comparar pesquisas de intenção de voto para presidente da Autoridade Palestina realizadas pela Palestinian Center for Policy Survey Research na Faixa de Gaza e na Cisjordânia antes e depois do conflito ocorrido nos meses de julho e agosto, pode-se perceber como este resultou no crescimento de popularidade do Hamas. Em simulações com os dois candidatos principais, Ismail Haniyeh, líder do Hamas, tinha 41% das intenções de votos em junho, contra 53% de apoiadores do candidato do Fatah, Mahmoud Abbas. Depois do ocorrido, em agosto, a popularidade de Haniyeh subiu para 61%, enquanto a de Abbas ficou com apenas 32% das intenções de voto. Além disso, o apoio ao retorno a uma intifada armada também cresceu significativamente, indo de 41% para 60% entre junho e agosto.

Quanto aos efeitos dos ataques de Hamas a Israel, também há estudos que podem ser reveladores. Um artigo divulgado na American Political Science Review exibe que, conforme o alcance dos mísseis do Hamas cresce e atinge regiões de Israel mais distantes da Faixa de Gaza, essas regiões mostram um aumento de adesão à direita entre 2% e 7%, indicando que estes mísseis afastam os israelenses de ideias para a construção da paz. Ademais, uma pesquisa de opinião realizada pelo canal do parlamento israelense (Knesset), se comparada à composição parlamentar atual, mostra o crescimento dos partidos de direita nas intenções de voto após a última escalada de violência. O maior representante da direita em Israel, Likud, partido a que pertence o Primeiro Ministro Benjamin Netanyahu, cresceria 45%, e o Jewish Home, considerado de extrema direita, teria crescimento de 50% se a eleição fosse realizada no dia 4 de setembro.

Além do crescimento político da direita, são vários os relatos que indicam também para o crescimento de um sentimento fascista anti-árabe nos judeus de Israel: o assassinato cruel de um jovem árabe no começo do conflito, o vídeo de uma demonstração em Tel Aviv em que se comemora a morte de crianças árabes, e o racismo latente de jovens em escolas israelenses são bons exemplos. Também é importante destacar que o número de ataques parte da política de “price-tag” [2] dobrou entre 2009 e 2011, e há relatos deste ano que indicam que esse tipo de ataque continua a crescer.

Após observar estes dados, vale questionar: os dois são verdadeiros rivais ou atores políticos que acabam se ajudando na permanência do poder em cada região? É possível perceber que, à revelia do crescente número de mortes, Hamas e Likud (assim como demais partidos israelenses de direita) beneficiam-se politicamente da guerra, pois têm sua popularidade condicionada à existência do conflito na região, parecendo inclusive trabalhar no sentido de sua reprodução. Tendo em vista os interesses destes atores, pode-se analisar o crescimento da violência como a vitória daqueles que se beneficiam da sua manutenção, enquanto os que lutam pela paz nos dois países saem com popularidade baixíssima. Vale destacar que, apesar de influenciar significativamente para a existência do conflito na região, o Hamas não pode ser considerado um ator da mesma dimensão que a direita israelense, que dispõe de armamentos mais fortes e causou maior prejuízo efetivo aos habitantes da região, sendo prova disso a disparidade no número de mortes nos dois lados.

Apesar de serem cada vez mais raros, existem soldados e outros membros da sociedade israelense denunciando abusos de Israel, assim como pessoas em Gaza que lutam contra as atitudes do Hamas. Neste conflito que parece ser infinito, a única atitude verdadeiramente política é a luta contra a justificativa da violência baseada em direitos, uma vez que não há real articulação entre a violência e as justificativas que a fundamentam. Muitas vezes, como mostrado aqui, há o contrário: a manutenção da violência das duas partes tem agido em direção contrária tanto à garantia da segurança dos israelenses quanto à conquista de direitos humanos básicos para os que habitam a Faixa de Gaza, sendo este objetivo o de maior urgência, pois os palestinos vivem há muito tempo em situação inaceitável.

[2] A política do “price tag” é o conjunto de ataques vandalistas praticados por colonos israelenses quase sempre contra propriedades e instituições de árabes, mas, às vezes, direcionado ao exército israelense, a cristãos e a organizações de esquerda.

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