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Eventos climáticos extremos e a urgência de respostas multilaterais

Por Marcela Gonçalves, Victoria Ennser e Rafaela Prestes - graduandas em Relações Internacionais pela PUC-SP e integrantes do Programa de Educação Tutorial de Relações Internacionais (PET-RI) A urgência da crise climática provocada por práticas humanas coloca em risco, a cada dia, a existência global. As últimas semanas foram marcadas por casos de desastres ambientais que ganharam destaque na mídia pela dimensão catastrófica. Entretanto, não se tratam de casos isolados recentes, mas sim consequências que estão se tornando cada vez mais intensas com as práticas humanas, sobretudo as que visam o lucro através de recursos naturais em detrimento de perdas irreconstituíveis ao meio ambiente, e sequelas nas relações internacionais que, cada vez mais vislumbram debates e formulações políticas tornando-se incapazes de acompanhar o ritmo desastroso deste processo.


Catástrofes ao redor do mundo Com as práticas de exploração ambiental da cadeia produtiva do sistema capitalista e a consequente devastação à nível global, estudos apontam para a irreversibilidade de ecossistemas e recursos que estão com seus limites sendo atingidos. Nas últimas semanas, casos extremos de catástrofes ganharam repercussão nas mídias pelo mundo. Fortes ondas de calor, incêndios, chuvas extremas e inundações foram algumas das consequências do aquecimento global em regiões da Europa. Na Itália, a temperatura chegou a 48,8 ºC, a maior registrada no continente na história, levando a um clima extremamente seco e alimentando incêndios florestais. Na Grécia, o cenário de ondas fortes de calor também foi catastrófico, com grande destruição do bioma, tomando conta em todo país, onde foi necessário haver evacuações também. Outro local que de forma semelhante sofreu consequências do extremo calor e seca foi o Canadá, com mais de 50 focos de incêndios e estima-se que cerca de um bilhão de espécimes foram mortos por uma das maiores temperaturas já sentidas.


Incêndios na Grécia em agosto de 2021 (Fonte: BBC)


Outros acontecimentos recentes foram as chuvas extremas e inundações em partes da Europa, como Alemanha, Bélgica e Holanda, onde foram registradas mais de 150 mortes devido à força e destruição causada, em meio ao aumento do nível das águas, casas enterradas sob deslizamentos e cortes de energia. A China também foi palco de fortes chuvas torrenciais, colocando milhares de pessoas em risco e sendo urgente os resgates de áreas mais afetadas. Imagens de inundação circularam pelas mídias e autoridades consideraram os episódios chuvosos como os mais fortes em mil anos.


Inundação em uma vila na Alemanha, 2021. (Fonte: Sebastian Schmitt/CNN)


Fonte: Chinatopix/AP

O Brasil, por sua vez, não ficou ileso às consequências da mudança climática. Nos últimos anos, foi possível observar o agravamento da crise ambiental, resultando em um aumento exponencial das queimadas e a consequente destruição da vegetação nativa. Da Mata Atlântica, por exemplo, restam menos de 15% de sua formação original; oscilações bruscas de temperaturas, ocasionando recordes de frio e de calor em um curto espaço de tempo, como visto em São Paulo nos meses de julho e agosto deste ano e a redução inédita de recursos hídricos, dentre outros acontecimentos, também somam a este fenômeno global. A situação brasileira, no entanto, é mais agravada e preocupante, uma vez que o próprio governo do presidente Jair Bolsonaro vem favorecendo o desmonte de políticas ambientais que o país conquistou ao longo dos anos, além de minimizar constantemente a dimensão do desastre ambiental assistido no país.


Fonte: Gabriela Biló/Estadão Conteúdo


Consequências catastróficas já eram previstas


Apesar de a magnitude das consequências do descaso com o planeta ser amedrontadora, tais acontecimentos não deveriam ser considerados como inesperados, visto que há décadas especialistas vêm alertando sobre os perigos que a ação humana na Terra pode causar, sobretudo desde a década de 1970, quando verificou-se um aumento exponencial da concentração de CO2 na atmosfera. Já era esperado o aumento da temperatura média do planeta e uma ocorrência cada vez maior - e violenta - de inundações, tempestades, queimadas e furacões, além de colocar em risco ecossistemas inteiros.


Contudo, se antes estes avisos sobre as mudanças climáticas já demonstravam que era necessário agir, o último relatório divulgado no início de agosto deste ano pelo IPCC (Intergovernmental Panel on Climate Change) organização criada no âmbito da Organização das Nações Unidas, carrega um tom de ultimato: ou repensamos e mudamos a nossa relação com o planeta imediatamente ou as consequências serão irreversíveis.


O relatório, pela primeira vez, quantificou a influência humana nessas mudanças: foi possível estimar que o planeta esquentou mais de 1ºC graças à ação dos seres humanos. Se essa tendência não for revertida, é bastante provável que a temperatura média do planeta aumente 1,5ºC dentro de um período de 20 anos, um prazo extremamente curto e perigoso. Caso isso aconteça, a humanidade irá extrapolar antes do fim do século a previsão de que o planeta aqueceria 2ºC - o que causaria impactos severos para a saúde.


Concomitantemente, o aumento das temperaturas provocará um maior derretimento das geleiras, subindo o nível do mar e podendo engolir ilhas e cidades litorâneas, bem como afetar a vida marinha. Além disso, causará mais precipitações, tornando assim mais frequentes fenômenos como as inundações vistas recentemente, ao mesmo tempo em que poderá agravar a seca em determinadas regiões. As oscilações de temperatura extremas serão cada vez mais comuns, afetando a agricultura e outras atividades humanas.


De modo geral, por meio do relatório é possível perceber que estamos mais próximos do que imaginamos de sofrer com eventos extremos. Tal aceleração demonstra a profundidade do impacto da ação humana no planeta, consequentemente representando um enorme risco à sobrevivência da humanidade. Não à toa, o relatório carrega consigo esse alerta vermelho que demonstra que não há mais tempo para esperar, é necessário agir imediatamente.


O futuro da cooperação na agenda climática e a COP26


Diante das manifestações aceleradas das mudanças climáticas, algumas questões inevitáveis reviveram nos debates políticos. Seremos capazes de frear o aquecimento global? Ou então, se já é tarde demais, o que resta ser feito para minimizar os impactos brutos sobre o meio ambiente e a população? Sobretudo a estas, mas também a outras questões, fóruns multilaterais têm se debruçado, na tentativa de unir e alinhar esforços em termos mitigação e adaptação às mudanças do clima, tais como previstos no Acordo de Paris.


Firmado em 2015 e aplicado a partir de 2020, o Acordo de Paris conseguiu comprometer todos os países no âmbito da ONU - contando com a saída e posterior retorno dos EUA - diferentemente do Protocolo de Kyoto, seu anterior. Ainda, conseguiu prever o aumento progressivo dos cortes de gases do efeito estufa, além da revisão periódica das metas de redução das emissões.. Mas se, mesmo com metas gradativas e proporcionalmente distribuídas entre os quase 200 signatários, a ação humana já provocou o aumento de 1ºC, como apontou o relatório do IPCC, de que maneira será possível frear a tendência de aquecimento temida de até 2ºC (comparado aos níveis pré-industriais - intervalo de 20 anos)?


As discussões sobre a agenda climática têm avançado através de múltiplos atores como organizações da sociedade civil, acadêmicos, fundações, organizações filantrópicas, empresas e movimentos de jovens; contudo, ainda é preciso o comprometimento e ação de líderes de Estado para concretizar os planos já estabelecidos no âmbito das relações internacionais. A Cúpula de Líderes, ocorrida em abril deste ano, marcou não somente o retorno dos EUA ao debate climático após a retirada do país do Acordo de Paris em 1° de julho de 2017, pelo ex-presidente Donald Trump, como a retomada do trato de urgência com a questão por parte dos países, sobretudo pela preocupação de se cumprir as metas acordadas em um prazo cada vez mais próximo.


Convocada por Joe Biden, externa ao calendário oficial da ONU, a Cúpula reuniu líderes de 40 nações e, apesar de diferentes e independentes, foi promovida como um evento preparatório para a 26ª Conferência das Partes sobre Mudança Climática da ONU (COP 26), organizada pelo Reino Unido em parceria com a Itália e que será sediada em Glasgow, de 31 de outubro a 12 de novembro de 2021. Entretanto, após discursos como o de Bolsonaro, fortemente nacionalista e negacionista, além de episódios como Joe Biden se ausentar durante o pronunciamento de outros líderes, ficou evidente a dificuldade de se pensar a agenda climática de forma abrangente - incluindo atores-chave - no âmbito do multilateralismo.



Fonte: UN Climate Change


Nestes termos, as expectativas agora estão voltadas à COP 26 e nos quase 20 eventos que compõem o “Road to COP”. Mesmo que se visualize a ocasião apenas como um “grande” evento, mais simbólico e menos vinculante, a COP servirá para que líderes globais avaliem os resultados do Acordo de Paris, passo mais importante dado em termos de política climática até o momento. Também incluirá nas discussões os impactos da pandemia de COVID-19 no meio ambiente, além de discutir entraves sobre injustiça climática nas estratégias multilaterais remanescentes desde a COP 25, o que pode representar grandes avanços para a fluidez da cooperação nesta agenda.


Impedir o avanço das mudanças climáticas e evitar consequências catastróficas ambientais sem precedentes têm sido discussões cada vez mais necessárias, senão já em seu auge de urgência. A COP 26 carrega a responsabilidade de responder às altas expectativas e reivindicações de pessoas e organizações ao redor do globo que parecem esgotadas pela falta de ação dos Estados em combater as mudanças do clima. Cabe acompanhar, portanto, as próximas movimentações da Conferência, além de exigir ações através dos diversos atores representados no evento.


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