A Editora Boitempo promoveu nos dias 22 e 23 de março de 2013, a segunda etapa do seminário “Marx: a criação destruidora”, no SESC Pinheiros, planejado em função do lançamento de sua nova tradução de “O Capital”, Vol. I.
Na sua primeira etapa já havia trazido o pensador eslavo, Slavoj Zizek, conhecido por seu trabalho que transita em diversas áreas do conhecimento, sob influência mais forte de Marx e Jacques Lacan. A segunda etapa contou com a presença de Michael Heinrich (cientista político e colaborador do projeto MEGA-2, instituição detentora e curadora dos manuscritos de Karl Marx e Friedrich Engels) e o famoso geógrafo britânico, conhecido por sólida produção na análise das dinâmicas do capital, David Harvey. Além de receber também diversos intelectuais brasileiros, com ampla produção sob essa linha, como o economista Paul Singer e o sociólogo Chico de Oliveira. As mesas debateram diversos temas como o “Marxismo no Brasil” e a “Crítica de uma Economia Política hoje”, e alguns pontos de concordância ficaram claros, o que é bastante atípico, em um terreno de debate conhecido pelo dissenso, como o Marxismo. Muito se fala sobre o retrocesso do Marxismo enquanto ideologia, principalmente após a década de 1970, e parece que essa ideia se reforça posto que o capitalismo em escala global continua a se desenvolver de vento em poupa, apesar de suas várias crises. Entretanto, algo foi repetido pelos palestrantes, e o espaço para a consolidação de um seminário de tal porte, demonstra claramente: o marxismo continua sendo a principal corrente crítica de contraponto ao capitalismo, e segue se mostrando como uma ideia forte e capaz de mover as pessoas a agir. E essas ideias não são colocadas de modo irresponsável, pelos palestrantes: muito foi dito também a respeito da necessidade do marxismo de se reinventar e se adequar a nova dinâmica do capital. A constituição do proletariado, como se vê na atualidade, continua sendo um mistério, e a falta de estudos sobre esse tema, por exemplo, dificulta uma centralidade necessária para a conformação de forças em busca de uma mudança estrutural do sistema. E como dito pelo professor Chico de Oliveira, “o Marxismo tem a obrigação de se colocar diante desse novo quadro e trazer uma resposta”, que seja capaz de se adaptar às diferentes experiências históricas. Caso contrário não poderá mais ser visto, como é desde o início de suas primeiras análises, como uma teoria revolucionária e permanentemente explicativa.
O professor Harvey lançou também, durante o evento, seu livro “Para entender o Capital – Vol. I”. Em sua conferência, “Lendo o Capital”, nos atentou para algumas lições que ajudam a entender a atualidade da maior obra de Marx e Engels: expôs com clareza à que Marx se propõe ao escrever a obra, e como ela deve ser encarada de modo que seja explicativa para diferentes particularidades. Ele fez uma diferenciação fundamental à compreensão da leitura do “Capital”, que mudou bastante o caráter com que a obra deve ser encarada. Marx se propôs a analisar o capital em si, e não o capitalismo. Ou seja, seu objetivo central foi desvendar, em pormenores, a máquina que ocupa o lugar central no capitalismo, e que é capaz de reproduzir essa classe dominante em diversos lugares do mundo, e não suas particularidades. Posto isso, não encontrarão em “O Capital”, os que procuram saber sobre discriminação de raça, ou gênero, ou até Imperialismo. Mas fica claro que esses assuntos, se dissociados da óptica do trabalho, estarão distantes de uma explicação plausível. Marx se debruça sobre o modelo econômico burguês, que diz como o capitalismo deve necessariamente funcionar, e nos mostra com ele de fato funciona.
Harvey convocou a sua plateia, acima de tudo, a tomar consciência do que Marx pode lhes ensinar e a entender que muito trabalho a ser feito surgirá a partir dessa noção: “o que você deve fazer por si mesmo?”. Marx fornecerá uma base crítica de análise, e nosso dever é projetá-la para as particularidades e explica-las. Esse método crítico mostra-nos porque as explicações tradicionais estão equivocadas, como justificar intervenções por meio de ideologias, por exemplo, e traz a sua grande novidade que é o conceito de fetichismo (que investiga relações sociais que se escondem por trás das mercadorias e as relações econômicas). Seu projeto é desfetichizar e criticar, e tal base é bastante fecunda para entender o momento que vivemos. De acordo com o prof. Harvey, o neoliberalismo só reinventou o que Marx criticava. “Uni-vos contra o grande Capital”, disse a professora Virgínia Fontes ao finalizar a sua fala, “pois ele continua vivo e atuante”.
Por Debora Fernandes.
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