No último dia 14/04 foi realizado na PUC-SP o debate sobre a Crise Política e Democracia no Brasil, considerando o papel de destaque da mídia ao longo do conturbado processo de consolidação democrática do Brasil. O evento contou com o apoio da rede Conexões em Luta e com a presença de convidados ilustres: Paulo Sérgio Pinheiro, Professor Titular de Ciência Política da USP, presidente da Comissão Independente de Inquérito da ONU sobre a Síria e coordenador da Comissão Nacional da Verdade; Ana Claúdia Mielke, jornalista, mestre em Ciências da Comunicação pela ECA-USP e membro da coordenação executiva do Intervozes; Renato Rovai, jornalista, professor da Cásper Líbero e editor da Revista Fórum; e do professor da casa Miguel Wady Chaia, vinculado ao Depto. de Política e Coordenador e Pesquisador no Neamp (Núcleo de Estudos de Arte, Mídia e Política) da PUC-SP. O evento contou com a mediação da professora Elaini Cristina Gonzaga da Silva, do Depto. De RI da PUC-SP e pesquisadora do CEBRAP.
Este foi o primeiro da série Diálogos em RI: academia-sociedade civil, iniciativa coordenada pelo Depto. de RI e pelo PET-RI e cujo objetivo é envolver os universitários, ativistas e o público em geral em temas relacionados ao grande campo das Relações Internacionais por meio dessas vozes fundamentais no debate de questões urgentes.
A exposição do professor Miguel Chaia abriu a mesa. Sua fala propôs uma profunda reflexão sobre as dinâmicas entre a política e a mídia. Segundo ele, a democracia ainda é um projeto político em andamento, sendo próprio dela a instabilidade, e a mídia neste cenário possui um papel eminentemente político, visto que ela entra no jogo político e atua nas correlações de força. Chaia afirma que mídia e política possuem uma dinâmica própria, que se interligam no exercício democrático, mas que vez ou outra entram em conflito. Ele ressalta a importância para a democracia de uma imprensa livre e tão democrática quanto seu regime, dado que as tecnologias da informação guardam potencialidades antidemocráticas também, sendo necessária uma certa vigilância sobre o jornalismo.
Ele defende a ideia de que a política e os políticos são reféns da tecnologia, e que as tecnologias podem servir aos mais diferentes regimes, como mostra bem o exemplo da utilização da mídia pelo nazismo, que através de discursos criavam um sistema de símbolos eficaz para os interesses do regime. A informação, segundo Chaia, constitui-se como voz de comando da mídia, que através de um conjunto de palavras de ordem tornam a informação um poder. Para ele, o perigo da mídia é guardado no seu potencial em produzir consensos, construindo um imaginário que dificilmente é destituído de algum poder político, devido aos impérios jornalísticos que constituem a grande mídia brasileira.
Logo após a exposição, foi aberta a sessão de comentários para os outros convidados.
A jornalista Ana Claudia Mielke abriu sua exposição fazendo coro às ideias apresentadas por Miguel Chaia e denunciando o papel da mídia na constituição de grupos de poder principalmente no Brasil e na América Latina. Segundo ela, a liberdade de expressão não é garantida a todos porque a mídia é intimamente ligada ao poder político, fazendo com que uma minoria controle os discursos e as informações veiculadas que a maior parte da população consome. Dito isto, a ativista do Intervozes traz em voga a discussão sobre a regulamentação da mídia, defendendo a ideia de que historicamente isto é visto como uma pauta de esquerda, enquanto em países onde a liberdade de expressão é valorizada, existem políticas fortemente consolidadas que visam combater o oligopólio midiático, de forma que a pluralidade de opiniões e vozes sejam garantidas.
Segundo ela, ainda que a mídia tenha o dever constitucional de promover a cultura e o debate político, enquanto não criarmos mecanismos para promoção de espaços e meios que possam potencializar diálogos e discussões, uma democracia ativa e participativa estará comprometida no Brasil.
Em seguida, Renato Rovai abre sua intervenção apontando o papel da Revista Fórum com pautas avessas às da mídia tradicional de massa. Segundo ele é necessário questionar a produção jornalística da grande mídia visto que há uma conjunção de interesses que unifica a posição dos veículos. Ele ressalta que a mídia tem suas posições políticas dado que a construção de um veículo jornalístico se dá justamente para defender interesses, que dificilmente são os da população. Portanto, não se pode falar em mídia separada da influência e do poder político.
O jornalista endossa a importância da regulamentação da mídia, discussão levantada por Ana Mielke, e afirma que essa pauta é não raro conduzida como se tratasse do cerceamento da liberdade de informação, quando na verdade defende ele, se trata da regulamentação do acesso mais plural à vozes e posições, fortalecendo assim a democracia e enriquecendo o debate político.
Rovai também coloca em pauta a discussão sobre como a mídia seduziu uma grande parte da população ao fomentar a polarização na sociedade, e questiona qual o espaço hoje reservado para a internet nesse processo. Para ele apesar de massiva, a Globo e a mídia tradicional podem estar abrindo espaço para fontes de informação alternativas, sendo a posição que a própria Revista Fórum alcançou em relação a nomes jornalísticos de peso, um indicativo desse processo.
Finalizando a sessão dos comentários, Paulo Sérgio Pinheiro abriu sua exposição abordando de maneira incisiva os pontos debatidos por Mielke e Rovai, trazendo ainda reflexões sobre as causas sociais e políticas dentro do debate sobre a mídia. Para ele, os governos falharam na construção de uma cultura democrática, e esta não irá se constituir plenamente enquanto houver desigualdades tão grandes em nosso país. Assim, ele sustenta que é incoerente discutir regulamentação da mídia enquanto a maior parte da população ainda sequer tem acesso a direitos básicos. O problema vai além do monopólio dos meios de comunicação, visto que existe uma falta democrática interna nos meios de comunicação e na cultura da sociedade em geral.
Segundo ele, a conjuntura em que estamos é uma crônica ensaiada de uma crise anunciada há tempos, e a falta de mobilização dos governos na pauta de regulamentação da mídia não ocorre justamente porque os governos não ousam desafiar os próprios aliados. Pinheiro finaliza sua exposição afirmando que o processo de impeachment é apenas um indicativo do que está por vir, se o mesmo for aprovado. A direita brasileira, para Pinheiro, vem se consolidando no cenário político há alguns anos e com o processo de impeachment consumado, o que se espera é uma onda conservadora muito grande com apoio de um parlamento reacionário.
Na sequência das exposições, houve intensa mobilização da plateia lançando questões e reflexões pertinentes para os integrantes da mesa, enriquecendo ainda mais o debate.
Abaixo, confira as entrevistas realizadas pelos alunos do PET- RI da PUC-SP com os integrantes da mesa.
Entrevista com Ana Claúdia Mielke
Entrevista com Renato Rovai
Entrevista com Paulo Sérgio Pinheiro
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