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Brasil e a batalha pelo clima: oposição entre desenvolvimento econômico e proteção da Amazônia no terceiro mandato Lula

Por Beatriz Miragaia e Laura Mick, graduandas em Relações Internacionais pela PUC-SP e integrantes do PETRI

Desde o início de seu terceiro mandato, o Presidente Lula tem buscado reposicionar o Brasil como líder na agenda ambiental e no combate à crise climática. Tal movimento se mostra como uma tentativa de recuperar o respeito internacional após o desastroso Governo Bolsonaro (2018-2022), que para além de representar um grave retrocesso nas políticas ambientais, relegou o país a uma posição inédita de pária no Sistema Internacional. De acordo com um relatório realizado pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE) em 2023, a taxa de desmatamento na Amazônia caiu quase 50% em comparação a 2022, marcando a menor taxa registrada nos últimos cinco anos. Entretanto, desafios internos tais quais a diversidade de interesses dos atores políticos e as novas possibilidades de crescimento econômico via extrativismo se mostram como uma ameaça a fauna e flora brasileira. A análise a seguir tende a explicitar as ações do terceiro mandato de Lula, os atores e seus interesses em relação à exploração de petróleo e pré-sal na Amazônia na Margem Equatorial. 


A mudança de conduta brasileira nesse cenário inclui o comprometimento em reduzir as taxas de desmatamento ilegal e as emissões de carbono, bem como o empenho em iniciativas diplomáticas. Um exemplo seria a criação da Cúpula da Amazônia, realizada em 2023, que reuniu líderes de diversos países amazônicos para definir as estratégias regionais de preservação. Desse modo, a posição proativa do Brasil se reflete no engajamento do país em fóruns multilaterais, como a COP28, em que o governo se valeu do tema ambiental para alavancar sua influência e atrair apoio e financiamento internacional.  Em relação a COP 29, o país apresentou na Contribuição Nacionalmente Determinada (NDC) a redução de emissões de gases de efeito estufa em 48% até 2025 e em 53% até 2030 em relação as emissões de 2005.


Ademais, a oportunidade de receber a COP30 no Brasil é uma conquista para o presidente Lula, que comentou: "Uma coisa é discutir a Amazônia no Egito; outra coisa é discutir a Amazônia em Berlim; outra coisa é discutir a Amazônia em Paris. Agora, não. Agora nós vamos discutir a importância da Amazônia dentro da Amazônia. Nós vamos discutir a questão indígenas, vendo os indígenas. Nós vamos discutir a questão dos povos ribeirinhos, vendo os povos ribeirinhos e vendo como eles vivem", além de ser significativo por marcar os 10 anos do Acordo de Paris, essencial para os países do Sul Global.


Entretanto, apesar desse empenho do Governo Federal, os desafios internos se mostram significativos dado a diversidade de setores e interesses que sustentam a coalizão do governo. Segundo dados do MapBiomas, as principais atividades responsáveis pelo desmatamento e queima do Cerrado e da Amazônia são as produções de gado e soja. Até 2021, a agropecuária já ocupava mais de 40% do Cerrado (23,7% pastagem; 8,9% soja; 7,3% mosaico agricultura e pastagem), e 14% na Amazônia (13,5% pastagem; 1,2% soja) da área original destes biomas. Por mais que o presidente se emocione ao falar da COP 30 no território, é evidente o conflito histórico entre os setores da agropecuária/extrativismo e as alas ambientais e de representação dos povos originários, que marcam a trajetória econômica nacional desde seus primórdios.


Neste cenário, a fim de analisar de forma mais aprofundada os desafios internos da agenda climática, o caso da exploração de petróleo na região amazônica se mostra uma questão central e extremamente ilustrativa. A Amazônia possui 871 blocos de petróleo, dos quais 52% estão no território brasileiro. A maior reserva nacional de petróleo e gás terrestre está na província de Urucu, no Amazonas, na qual são produzidos 35.387 barris de petróleo por dia e 13,9 milhões de metros cúbicos de gás natural, além de 1,2 tonelada de GLP.


Em maio de 2023, a Petrobras apresentou um requerimento para perfurar a bacia da Foz do Amazonas na Margem Equatorial, a 170 km da costa do estado do Amapá, ao norte, e a 500 km da foz do Rio Amazonas. A licença foi negada pelo Ibama sob a justificativa de não conter garantias de cuidado com a fauna e flora local em caso de vazamento de óleo, para além de não considerar os impactos sobre três terras indígenas localizadas na costa norte do estado. Após entrar com novo requerimento, a Petrobras aguarda a análise e decisão. 


A exploração na costa brasileira é um dos principais planos da Petrobras, com um planejamento estratégico de US$3,1 bilhões para a perfuração de 16 poços na Margem Equatorial no período de 2024 a 2028. A área a ser explorada tem início na costa do Rio Grande do Norte até o Amapá, com forte presença de comunidades costeiras que têm como subsistência a utilização das fontes de água salubre. O projeto tem como objetivo a perfuração de poços a cerca de 170 km da costa do Amapá e até 2.880 metros de profundidade. Ademais, a área é essencial para espécies de fauna e flora brasileira, o que gera preocupação em ambientalistas e a população indígena.  O projeto será iniciado apenas com a licença para Avaliação Pré-Operacional (APO) do Ibama, que analisa biodiversidade, magnitude dos impactos, persistência dos impactos e comprometimento da área prioritária. 


A relação entre a Petrobras e o Governo Federal é essencial para a compreensão do foco em desenvolvimento econômico a partir do petróleo. Para além das pressões que a Petrobras realiza para atuar em áreas de preservação, o presidente Lula se declara favorável à exploração do petróleo como meio de desenvolvimento – mesmo com a oposição de diferentes ministérios de seu governo.  Em discurso durante sua viagem ao Japão em 2023 para encontro do G7, sobre a exploração na Margem Equatorial, o presidente declarou que “Quem mora na Amazônia tem direito a ter os bens materiais que todo mundo tem”, assim, priorizando o lucro pelo petróleo e o desenvolvimento para a Petrobras aos interesses da população local. 


 A Petrobras afirma que possui ações para garantia da segurança do meio ambiente. Porém, ainda que a empresa estatal que atua em Urucu desde 1986 preze por uma exploração segura, ela possui um histórico de 62 vazamentos de óleo apenas em 2022 – dado preocupante para a segurança ambiental da região. Ademais, no recente plano estratégico aprovado pela Petrobras há um investimento de US$102 bilhões para os próximos cinco anos, sendo apenas 11% voltado a iniciativas de “baixo carbono”. Assim, embora o Brasil tenha como meta uma matriz energética limpa, o plano tem como enfoque a exploração e produção de petróleo e gás, sendo 72% do orçamento destinado apenas à exploração.


Outrossim, em relação aos atores políticos, é possível destacar tanto agentes públicos quanto representantes da sociedade civil e ONGs com opiniões diversas sobre a ação. Por parte do Ministério de Minas e Energia, há a reivindicação da exploração, justificando-a como uma necessidade estratégica para atender à demanda energética e gerar receitas para a transição energética. De acordo com o ministro Alexandre Silveira na Comissão de Minas e Energia na Câmara dos Deputados em junho de 2024, por mais que o governo pregue pela transição para energias limpas, o país não pode abrir mão do faturamento do petróleo, ainda mais em face da necessidade de combater a miséria, fome e investir em educação e saúde.


Contudo, tal posicionamento não é um consenso entre os ministros. Marina Silva, representante do Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima, no Fórum Econômico Mundial em Davos, destacou a importância da floresta para o desenvolvimento econômico, social e cultural, entretanto, afirmou também que não é decisão do Ministério do Meio Ambiente optar por explorar ou não a Amazônia. Além disso, na 76º Reunião Anual da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SPBC) realizada em Belém, a ministra pontuou que: “[...] é uma decisão técnica e num governo republicano a gente tem que respeitar a decisão técnica que é tomada”.


Em relação as organizações da sociedade civil brasileira, os posicionamentos estão alinhados. A título de exemplo, como o Greenpeace e a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB) se manifestaram contra a aprovação do projeto, representando os interesses de organizações ambientalistas que exercem pressão no governo brasileiro contra a exploração, a fim de garantir maior responsabilidade ambiental. Entretanto, por mais que houvesse o apelo da sociedade civil, o governo junto a Petrobras tem seu interesse econômico alinha a exploração do petróleo. Por tal motivo,  o  Greenpeace esteve presente na costa do Amapá e Pará em março de 2024 para início do projeto Expedição Proteja a Costa Amazônica, que tem como objetivo coletar dados sobre as correntes marítimas na região junto ao Instituto de Pesquisas Científicas e Tecnológicas do Estado do Amapá (IEPA) para investigar o avanço da indústria petrolífera e mapear os caminhos do petróleo em caso de vazamento. De acordo com Marcelo Laterman, Ocean Campaigner do Greenpeace Brasil, as comunidades costeiras são vulneráveis, visto que um possível vazamento terá efeitos catastróficos à subsistência dos que dependem da água para alimentação e renda. 


Assim, se torna evidente que a exploração de petróleo na Margem Equatorial da Amazônia simboliza um desafio crucial para a política ambiental e energética do Brasil, expondo o delicado equilíbrio entre crescimento econômico e preservação ambiental. Embora o governo Lula tenha avançado em sua agenda de combate ao desmatamento e fortalecimento da imagem ambiental do país, questões internas, como o confronto de interesses entre o desenvolvimento da indústria petrolífera e a conservação dos ecossistemas, permanecem. A busca por um modelo de desenvolvimento sustentável que contemple as necessidades socioeconômicas das populações locais e promova a proteção ambiental exige negociações complexas e compromissos entre atores governamentais, sociedade civil e comunidade internacional.


Referência bibliográficas:

Avanço da agropecuária reduz biodiversidade no Cerrado e na Amazônia, aponta estudo. Disponível em: <https://www.wwf.org.br/?81708/Avanco-da-agropecuaria-reduz-biodiversidade-no-Cerrado-e-na-Amazonia-aponta-estudo>. Acesso em 8 dez 2024



COP 30 no Brasil. Disponível em: <https://www.gov.br/planalto/pt-br/agenda-internacional/missoes-internacionais/cop28/cop-30-no-brasil>. Acesso em 8 dez 2024



FRANCA, C. “Quem mora na Amazônia tem direito a ter os bens materiais que todo mundo tem”, diz Lula sobre exploração do Rio Amazonas. Disponível em: <https://www.brasil247.com/brasil/quem-mora-na-amazonia-tem-direito-a-ter-os-bens-materiais-que-todo-mundo-tem-diz-lula-sobre-exploracao-do-rio-amazonas>. Acesso em: 07 dez. 2024.



Greenpeace. Inside the effort to protect the Amazon coast from oil spills. Disponível em: <https://www.greenpeace.org/international/story/65510/amazon-coast-brazil-oil-drilling-spill/>. Acesso em 9 dez. 2024.




JUREMA, B. Decisão sobre exploração de petróleo na Amazônia é o grande dilema da política ambiental do Brasil. Disponível em: <https://theconversation.com/decisao-sobre-exploracao-de-petroleo-na-amazonia-e-o-grande-dilema-da-politica-ambiental-do-brasil-239286>. Acesso em 8 dez 2024





LIMA, B. Ministro de Minas e Energia defende exploração de petróleo na Foz do Amazonas: “É a visão majoritária no governo”. Disponível em: <https://oglobo.globo.com/economia/noticia/2024/06/19/ministro-de-minas-e-energia-defende-exploracao-de-petroleo-na-foz-do-amazonas-e-a-visao-majoritaria-no-governo.ghtml>. Acesso em: 9 dez. 2024.




NDC - ambição climática do Brasil. Disponível em: <https://www.gov.br/mma/pt-br/assuntos/mudanca-do-clima/NDC>. Acesso em 9 dez 2024




SILVA, M. Marina Silva diz que decisões sobre exploração de petróleo na Margem Equatorial “são técnicas”. Disponível em: <https://g1.globo.com/pa/para/noticia/2024/07/13/marina-silva-diz-que-decisoes-sobre-exploracao-de-petroleo-na-margem-equatorial-sao-tecnicas-em-evento-em-belem-e-assim-que-tem-que-ser.ghtml>. Acesso em: 9 dez. 2024.




Urucu completa 30 anos de exploração de petróleo em plena Amazônia. Disponível em: <https://agenciabrasil.ebc.com.br/economia/noticia/2016-12/urucu-completa-30-anos-de-exploracao-de-petroleo-em-plena-amazonia>. Acesso em: 09 dez 2024

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