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A Wagner PMF e suas articulações na Síria.

Updated: Apr 2, 2021

Introdução

O modelo de privatização de funções do estado responde a diferentes lógicas. No setor de Defesa e Segurança o estado, normalmente, continua sendo o grupo que reivindicou pra si o uso e monopólio dos meios de violência, como cita Max Weber. Entretanto, devido as diferentes frentes que a Guerra Moderna ganhou no início do século XXI após a Segunda Guerra do Iraque, o surgimento de PMFs (Private Military Firms) se torna mais um ator a compartilhar o cenário no meio destas guerras. De acordo com Peter Singer podemos definir PMFs como pessoa jurídica que estabelece contrato com um departamento ou agência governamental para fornecer equipamentos e/ou serviços em zonas de conflitos armados.

Guerras Modernas respondem as lógicas de constantes mudanças e fluidez de atores, ou seja, os números de envolvidos no conflito não são dois, como em guerras clássicas. Ainda, a distinção entre civis e envolvidos diretamente na trama da guerra deixa de ser clara, causando inúmeras mortes. O estado nacional se sente ameaçado pela variedade de forças civis militarizadas que ameaçam seu monopólio da violência, como no cenário atual da Síria, onde forças civis e militares se confundem diariamente, já causando mais de 500.000 mortes, desde o início em 2011.

Wagner PMF na Síria.

Empresas militares privadas são proibidas de acordo as leis da Rússia, entretanto isso não impede a existência de algumas, como mostra o site informnapalm.org :


Fonte: informnapalm.org


Uma delas, a Wagner PMF teve atuação em diversos conflitos, desde 2014 na Ucrânia até a atual guerra na Síria. A empresa não tem site, ou domínio registrado, age pela marginalidade de fóruns online de recrutamento, como reportou a SkyNews. É estimado que tenha por volta de dois mil e quinhentos contratados em território Sírio. Os soldados em serviço recebem em média trezentos mil rublos, cerca de cinco mil dólares por mês e o treinamento ocorre em Molkino, na região de Krasnodar no sul da Rússia.

De acordo com diversas fontes, Dmitry Utkin, militar russo da inteligência que atualmente está na reserva, é o fundador da empresa. O mesmo Utkin é visto em diversas oportunidades no Kremilin em eventos com a alta cúpula do poder russo. Outra figura relacionada à Wagner e ao alto escalão russo é o executivo Yevgeny Prigozhin, além de investidor na PMF, é dono das empresas Concord e investidor da Evro Polis, empresa de extração de petróleo e gás.

Prigozhin tem relação direta com o presidente russo, conhecido como Putin’s chef, devido a atuação no ramo alimentício de suas empresas. Também, o empresário russo foi indiciado na justiça estadunidense pelo seu vínculo com a Internet Research Agency, empresa que foi usada para promover o ex candidato a presidência Donald Trump. Ainda, como parte de seus negócios, há a Evro Polis, empresa responsável por um acordo com o governo sírio que, segundo o site Fontanka, se comprometia a recuperar os territórios de produção de petróleo e gás tomados pelo Daesh, e como pagamento receberia 25% da produção desses territórios.

A Wagner é tida como o exército para fazer o trabalho sujo da Rússia. O próprio presidente russo Vladmir Putin admitiu que PMFs são uma maneira de implementar interesses nacionais sem o envolvimento direto do estado. Os conflitos modernos tornam-se impopulares facilmente, pela alta velocidade das informações, a população exerce grande função em pressionar o governo para se retirar de conflitos armados. Entretanto a atuação de PMFs representa um vácuo de responsabilidade sobre esses combatentes, mercenários, como são chamados. O estado, uma vez que compra os serviços de empresas de guerra não tem obrigações de reportar suas mortes, pois à vista do Direito Internacional, mercenários não são considerados soldados na guerra.

Um exemplo negação estatal com tais empresas é o combate travado em Deir al-Zor, rica região em petróleo, durante a noite entre 7 e 8 de fevereiro de 2018. De acordo com o New York Times, eram cerca de 500 combatentes pró-Síria, 27 carros e tanques militares que começaram os ataques a tropas estadunidenses. Os números de mortes variam entre 200 e 300 mortos do lado pró-Síria e nenhuma baixa do lado dos EUA. O governo de Moscou nega a participação do exército russo e fala apenas em quatro cidadãos russos mortos. Com o acordo entre a Evro Polis e o governo de Aleppo, fica clara a intenção de tomar pra si uma região rica na exploração de petróleo.

Tal combate foi um dos mais sangrentos do exército estadunidense enquanto combate o Daesh, entretanto, o lado oposto era de mercenários da Wagner e tropas pró-Síria. O evento mostra a nova face das guerras modernas, onde atores não estatais tomam lugar de tropas tradicionais, pelo lado russo. Ainda, o claro objetivo de mercado que as tropas mercenárias possuem, uma vez que os ataques se deram perto de uma estação de petróleo e gás da Conoco guardada pelo exército dos EUA em parceria de Curdos e tropas sauditas.

Essa não foi a primeira vez que a Wagner foi contratada pelo governo russo, havia atuado na anexação da Criméia em 2014 e, posteriormente, foi deslocada ao leste Ucraniano para a região de Dombass onde conflitos haviam sido deflagrados. A atuação da empresa não parece ter sido abalada com as perdas contra o exército estadunidense, uma vez que foram vistos potenciais campos de treinamento na República Centro Africana e no Sudão. Assim podemos observar o movimento de expansão que empresas como a Wagner têm no cenário internacional atual, onde conflitos irregulares iniciam constantemente e o modelo de capitalismo proporciona atuação livre de PMFs.

Conclusão

Quando analisamos a Governança Internacional e o cenário que proporcionou sua emergência notamos que o estado não perde forças ou deixa de ser ator nos debates, mas houve a sobreposição de uma nova camada de tomadores de decisões na política internacional. Os atores privados têm espaço para serem influenciadores e produtores de normas no âmbito internacional e assim o fazem constantemente em áreas que, tradicionalmente, eram de monopólio do estado, como Defesa e Segurança.

Como vimos, a Wagner atua na marginalidade da lei. Entretanto, seus fundadores e investidores são pessoas com relações ao presidente russo que declara apoio a atuação de PMFs para garantir o interesse nacional. Guerras modernas e o contexto histórico proporcionam o envolvimento de tais atores na política internacional que encontram cenário de expansão de seus negócios, tanto no campo de batalha, quanto dentro do poder estatal.

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