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A articulação social na luta contra a violência doméstica e o impacto da desigualdade de gênero na p

Updated: Apr 2, 2021

Foto em destaque: Monteiro e Abreu.

A Pandemia da Covid-19 ficará marcada como uma das piores crises sanitárias da história, a qual impactou diversas nações em esferas política, cultural e socioeconômica. Ainda assim, as várias formas de desigualdades estruturais foram expostas, tal como a desigualdade de gênero. Posto isto, a concretização dos direitos e das liberdades é comprometida, ao mesmo tempo que a violência contra a mulher se intensifica no âmbito doméstico, uma vez confinadas com seus agressores. Assim, pretendo discutir a articulação do movimento feminista ao trazer a violência contra a mulher ao alcance da sociedade civil e a situação da mulher diante da violência doméstica, como um fenômeno global, durante a pandemia.

IMAGEM 1

Arte: @porracristo (Instagram)

A violência contra a mulher manifesta-se devido às relações historicamente desiguais de poder entre os sexos, que resulta em dominação e discriminação da mulher, além de forçá-las a uma posição de subordinação ao homem[1]. Cerca de 35,6% das mulheres já vivenciaram violência física e/ou sexual no mundo[2]. Assim, esse fenômeno é uma preocupação global em virtude da dimensão sistêmica que ele se encontra, além de ser considerado uma violação dos Direitos Humanos. Logo, no que concerne a violência doméstica, é inevitável extrapolar essa questão da esfera privada e meter a colher, sim, para evitar comportamentos violentos e, inclusive, a morte de mulheres. No gráfico, observamos a porcentagem de violência contra a mulher pelo parceiro em uma dimensão global.

GRÁFICO 1

Fonte: Global and Regional Estimates of Violence Against Women: Prevalence and Health Effects of Intimate Partner Violence and Non-partner Sexual Violence, WHO, 2013[3].

A violência doméstica, tão somente, foi vetada do debate público em virtude da invisibilidade do ambiente doméstico. A partir da década de 1980, o movimento feminista contribuiu para a desconstrução da estrutura patriarcal e de inúmeras desigualdades nas sociedades. Contudo, a fim de fomentar a visibilidade, o Estado era primordial para dar respostas às reivindicações[4], já que é o protagonista na determinação da ordem interna.

Com o início da pandemia de Covid-19, o distanciamento social começou a ser adotado por Estados como uma ferramenta para conter a propagação do vírus na sociedade. Todavia, as restrições impostas resultam em estresse social e econômico dos indivíduos por ação de desemprego, insegurança e tensões financeiras, entre outras complicações. Além do mais, o acesso a diversos suportes e serviços foram gravemente impactados. Nessas circunstâncias, a violência doméstica acentua-se significativamente e os setores essenciais são coibidos de ajudar as vítimas[5]. Através do gráfico abaixo, observamos alguns países que notificaram uma alta de denúncias de violência doméstica desde o início das políticas de isolamento.

GRÁFICO 2

Elaboração própria. Fontes: [6] [7] [8] [9] [10] [11] [12] [13] [14].

Assim, através da articulação do movimento feminista com a participação do Estado, estabeleceu-se políticas públicas, ampliou ações afirmativas e aprimorou a legislação de proteção à mulher com a implementação de políticas e de acordos internacionais[3]. Com isso, o Estado era necessário para influenciar a sociedade, através de leis e penalidades, para que a situação da mulher não se estabelecesse a partir de um mecanismo socialmente construído de divisão sexual do trabalho, ainda problemático, no qual a violência contra a mulher é naturalizada pela estrutura de dominação[15].

Nesse sentido, a atenção de governos e instituições internacionais, tal como a Organização das Nações Unidas, proporcionaram um lugar de diálogo e de proteção e cuidado das vítimas de violência doméstica. Isso, visto o aparecimento de um sistema de Estados e o desenvolvimento de movimentos, grupos, redes e organizações com o compromisso de debate público transnacional[16] que permitiu a visibilidade da violência contra a mulher para além do doméstico. Contudo, em decorrência da pandemia, os setores do Estado e da sociedade, e as instituições internacionais foram prejudicados em consequência da vulnerabilidade do sistema diante de instabilidades.

Como efeito, o isolamento social veio acompanhado pela falta de suporte, de comunicação e de informação de serviços para as mulheres vítimas de violência, no momento, principalmente doméstica. Devido a dimensão global, o aumento de notificações preocupa vários países que apresentavam essas preocupações anteriormente a crise da Covid-19. Isso sugere um retrocesso na luta de não-violência contra a mulher, uma vez que a invisibilidade pode ser entendida como uma legitimação para perpetuá-la[17]. No mais, os custos globais para o enfrentamento da violência contra a mulher, antes estimados em U$1,5 trilhão[14], são claramente sensibilizados pela estagnação econômica e, em consequência, atingem negativamente as organizações locais especializadas na assistência.

Assim, observamos que a violência contra a mulher ultrapassa as fronteiras, sendo uma questão transnacional. Agora, em contexto de isolamento social, das inúmeras violências contra a mulher, a violência doméstica se sobressai. O movimento feminista teve uma atribuição significativa ao trazer a pauta do privado ao público, como um encargo do Estado. Além disso, empenham-se em assegurar a visibilidade doméstica e internacional. No mais, entende-se que o movimento social proporciona representatividade e ajuda às vítimas junto com diversos grupos e organizações. Todavia, há ainda desafios que dificultam o acesso ao suporte e serviços às vítimas em consequência da negligência do Estado e, sobretudo, da sociedade. Será que em briga de marido e mulher não se mete a colher? Apesar do compromisso de governos, a sociedade deve ficar de olho para que as mulheres não sejam violentadas e, principalmente, marginalizadas em decorrência da desigualdade de gênero, em especial com o recente obstáculo.

Recomendo o vídeo da Campanha Call, do Instituto Maria da Penha. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=A6CslhHgTrA>. A violência doméstica teve um aumento de até 50% em alguns Estados durante o confinamento. Preste atenção nos sinais. Alguém pode estar precisando de você.

Referências Bibliográficas

[1] UNITED NATIONS HUMAN RIGHTS. Declaration on the Elimination of Violence Against Women, 1994.

[2] WORLD HEALTH ORGANIZATION. Global and Regional Estimates of Violence Against Women: Prevalence and Health Effects of Intimate Partner Violence and Non-partner Sexual Violence, 2013.

[3] Ibidem.

[4] GREGORI, Juciane de. Feminismos e Resistências: trajetória histórica da luta política para conquista de direitos. Caderno Espaço Feminino – Uberlândia-MG – v. 30, n. 2 – Jul./Dez. 2017.

[5] UNITED NATIONS. Policy Brief: The Impact of Covid-19 on Women, 2020.

[6] FÓRUM BRASILEIRO DE SEGURANÇA PÚBLICA. Violência Doméstica durante a Pandemia de Covid-19, Ed. 2, 2020.

[7] HOLMAN, John. Domestic abuse spikes in Mexico amid virus outbreak. Al Jazeera, 2020. Disponível em: <https://www.aljazeera.com/news/2020/04/domestic-abuse-spikes-mexico-virus-outbreak-200410143527001.html>. Acesso em: 13/06/2020.

[8] LEPESKA, David. Turkish women’s rights movement fights back as COVID-19 spurs violence. Ahval, 2020. Disponível em: <https://ahvalnews.com/gender-equality/turkish-womens-rights-movement-fights-back-covid-19-spurs-violence>. Acesso em: 11/06/2020.

[9] NANDAN, Ayushree. Is domestic violence the next pandemic in India? Times of India, 2020. Disponível em: <https://timesofindia.indiatimes.com/blogs/voices/is-domestic-violence-the-next-pandemic-in-india/>. Acesso em: 11/06/2020.

[10] OLAOLUWA, Azeez At. Coronavirus domestic violence: Surviving lockdown wen you dey trapped with your abusive partner. BBC, 2020. Disponivel em: <https://www.bbc.com/pidgin/tori-52675405>. Acesso em: 03/06/2020.

[11] REFUGE ORGANIZATION. Increase in calls to national domestic abuse helpline since lockdown measures began, 2020. Disponivel em: <https://www.refuge.org.uk/25-increase-in-calls-to-national-domestic-abuse-helpline-since-lockdown-measures-began/ >. Acesso em: 03/06/2020.

[12] SHIMANYULA, James. Activists appeal to AU as abuse against women, girls soars under Covid-19. Radio France Internationale, 2020. Disponível em: <http://www.rfi.fr/en/africa/20200427-activists-appeal-to-au-as-abuse-against-women-girls-soars-under-covid-19>. Acesso em: 15/06/2020.

[13] UNFPA ORGANIZATION. When quarantine is unsafe: domestic violence survivors seek help in Ukraine. Disponível em: <https://www.unfpa.org/news/when-quarantine-unsafe-domestic-violence-survivors-seek-help-ukraine >. Acesso em: 07/03/2020.

[14] UNITED NATIONS WOMEN. Covid-19 and Endings Violence Against Women and Girls. 2020.

[15] BOURDIEU, Pierre. A Dominação Masculina. Ed. 11. Editora Bertrand Brasil, 1998.

[16] KALDOR, Mary. The idea of global society. International Affairs, vol. 79, issue 3, p. 583-593. 2003.

[17] ANGELIM, Fabio Pereira; Diniz, Glaucia Ribeiro Starling. O pessoal torna-se político: o papel do Estado no monitoramento da violência contra as mulheres. Rev. psicol. polít. vol.9 no.18 São Paulo dez. 2009.

Imagem 1: arte retirada do Instagram @porracristo.

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